terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A prisão pode estar em sua mente

Nossa sociedade é regida por economistas, o dinheiro é o centro de nosso mundo, a imprensa e a cultura são meros instrumentos do consumismo e do capital. No último sábado, em uma conversa informal com colegas de estudos vivenciei um exemplo muito claro disto: contava que visitaria uma penitenciaria no domingo e os comentários destes amigos diziam que eu era louco ou que eu faria algo sem sentido. Mas me pergunto quais seriam os comentários se eu dissesse que iria a um show de rock internacional ou a um Shopping Center? Acredito que conhecer a realidade de meu país, ou das estruturas da sociedade é quase uma obrigação de todos os brasileiros, por isto conhecer o “interior” do sistema carcerário sempre foi uma de minhas maiores necessidades.

Em um país que possui quase 184 milhões de pessoas, o Brasil possui quase 500 mil pessoas presas. Os dados do Departamento Penitenciário Nacional apontam que apenas 8% destas pessoas estudam. Segundo a lei de execução penal Lei Nº 7.210 o objetivo da prisão é: Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Apesar de a educação ser tema de quase todas as campanhas políticas, em São Paulo nenhum professor trabalha em penitenciárias, a educação é exercida apenas pelos presos.

Entretanto, estas informações são apenas números. Como poderia escrever sobre uma realidade não conhecida? Não é fácil para um jornalista entrevistar um preso ou conhecer o que acontece dentro de uma unidade prisional. Apesar de muitas pessoas pensarem que o objetivo da prisão é punir os presos e castigá-los de todas as formas possíveis, a lei e o bom senso dizem o contrário. De qualquer forma, um encarcerado sempre retornará (desde que não seja assassinado) para as ruas e precisa de todo o estímulo possível para que não volte a cometer crimes. Discursos da sociedade, o que inclui jornalistas, críticos e as pessoas que encontro nos mais diversos locais, mostra que muita gente ainda acredita que cuidar dos presos é uma obrigação somente do Estado. Mas como é que o Estado está preparando os encarcerados para voltar para a liberdade?

Depois de uma conversa informal com o escritor Ferréz, o mesmo comentou que iria a uma instituição prisional. Com todos meus questionamentos, acreditava que esta poderia ser a minha chance. Pedi a ele para acompanhá-lo nesta visita, que aconteceria na cidade de Guarulhos, na unidade chamada "José Parada Neto". Quando cheguei descobri que se tratava da cerimônia de encerramento de um projeto chamado “Como Vai Seu Mundo”, idealizado pelo Rapper Dexter, com o apoio do juiz corregedor da Comarca de Guarulhos, Jaime Garcia Jr. O evento foi arquitetado pelo Coletivo PESO e realizado pelo Instituto Crescer. Com a presença dos educadores que participaram do projeto, rappers e aberto a todos os presos da instituição, esta tarde se tornou uma das mais impactantes de minha vida.

Pouco a pouco, a cultura do Hip Hop mostra que o entretenimento não é seu único objetivo. Todos os participantes mostravam uma extrema alegria pela possibilidade de contribuir para uma sociedade mais segura, e, principalmente, para a preparação dos presos para o seu retorno a sociedade. Conversei com muitos presos, que também reconheciam a importância do curso e do evento. Alguns deles receberam o certificado de sua participação no projeto. Conversas me mostravam que a admiração dos presos não estava no simples fato destas pessoas estarem lá para contribuírem com seu desenvolvimento, mas por estas pessoas os respeitarem e os tratarem como seres humanos. Mais uma vez noto que o amor dá mais resultado que a dor e a violência.

Mas a situação dos presos no Brasil ainda está longe de ser boa. Só quem conhece o que se passa por dentro das grades e muralhas das prisões sabe o que estou falando. Tenho alguns amigos e conhecidos que já foram presos, ou que ainda estão; e por todos os relatos, entendo que, para que o preso não se torne reincidente, é necessário reinserir estas pessoas no mercado de trabalho, através de uma política de educação verdadeira nos ambientes prisionais. Em algumas penitenciarias existe a possibilidade do preso trabalhar ou/e estudar, de forma a reduzir sua pena. Mas nem tudo são rosas. Quase sempre o preso que trabalha não poderá estudar, ou vice versa, pois os horários destas atividades são simultâneas. Na penitenciária para os presos em regime fechado, chamada “Desembargador Adriano Marrey" - Guarulhos II, onde o horário em que as celas estão abertas das 8 às 16 horas, não existe a possibilidade de um preso estudar e trabalhar: o horário de trabalho é o mesmo do horário de estudos e não existe educação após as 16 horas. Neste tipo de sistema, todos perdem.

Um dos problemas que a impressa mais cita em suas matérias sobre a penitenciária é o uso do celular por presos, o que levou inclusive ao aumento dos procedimentos de revista para a entrada de familiares nos dias de visita. Mas não vejo o mesmo empenho da imprensa em entender os motivos dos encarcerados em continuar a utilizar estes aparelhos. Os presos no Brasil não têm direito de se comunicar com sua família ou com uma pessoa que pode o apoiar para a re-socialização - é o ponto cego que faz com que, na realidade, quase todas as penitenciarias tenham celulares, onde o principal objetivo é pedir ajuda; seja da roupa de cama, do chinelo de dedo a talvez uma pasta de dente, ou mesmo uma toalha. Para o Estado estas necessidades são menores, ou pouco importantes para recuperar uma pessoa privada de sua liberdade. Esta “indiferença” e faz com que muitos busquem uma solução para esta situação.

Discutir o que acontece dentro dos presídios pode contribuir para a sociedade, mas é preciso conhecer o que acontece nestas instituições para que os erros não se perpetuem por mais tempo. Alguns exemplos como o do rapper Dexter, que iniciou sua trajetória artística dentro da unidade prisional do Carandiru, mostram que o retorno para a sociedade tem que ser marcada por uma transformação de pensamento e não por punições aplicadas aos presos que violam os Direitos Humanos

2 comentários:

  1. se os direitos humanos começar a funciona decentemente a maioria desses problemas não existiriam e teríamos pessoas mas capazes para retornar a sociedade.....

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  2. Infelizmente a sociedade, em termos gerais, não dá importância para algo que está fora de seu campo de visão... Espero que isso possa mudar. Belo texto!

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